Recomeço da partida

Passaram quatro anos.
Sou uma pessoa mais distante desde aquela notícia.
Desistimos de vez em tentar ter um filho.
O amigo André fala-me em adoptar uma criança.
Não é a mesma coisa.
Como se sente a criança a crescer no ventre com uma pessoa adoptada?
Não se sente.
Não quero adoptar. Não quero pensar nisso.
É uma solução de recurso. E é um recurso que agora não quero tomar.
Amanhã veremos.
Estou a chegar ao consultório.
Não me tenho sentido bem. Algumas tonturas.
"Ana Maria". Chamam-me.
"Como está Sr. Doutor?".
"Como está?" replica educadamente. "Então é aquele mal estar que me falou?"
Explico, apresento os exames e análises.
"Bom, parece que temos aqui um problema" afirma o médico.
Fico apreensiva.
"Um problema a que costumamos dar parabéns", continua. Fico confusa.
Percebe a minha confusão.
"Parabéns", repete. "Está grávida".
Tento replicar um "Mas...", um "como...".
Ele simplesmente sorri, querendo reafirmar.
Querendo dizer "É verdade".

"Saída"

aproxima-se o fim da viagem.
alguns ja amontoados à porta de saída do comboio, com este ainda em andamento.
outros sentados, mas preparados para partir rumo à saída.
o comboio pára finalmente.
ouve-se "estação sta. apolonia; estação terminal"
o amontoado desvanece-se.
levanto-me.
desço as escadas.
na plataforma, um aglomerado de gente.
há apertos de mãos formais.
abraços sentidos.
beijos tímidos.
beijos acalorados.
o vento de principio de noite regela-me.
sigo na direcção das indicações "saída".